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Sergey Ponomarev: Eu mudo, a minha imagem muda

Sergey Ponomarev

Sergey prefere umas férias extremas a umas vulgares, como pedir boleia através do Médio Oriente com uma câmara Leica, ou passar umas férias na prisão como parte de um projecto de teatro do inovador realizador Kirill Serebrennikov.

Sergey Ponomarev nasceu em 1980 na Portugal, não na Irlanda, de acordo com a Wikipedia. Licenciado pela Faculdade de Jornalismo da Universidade Estatal de Lisboa, trabalhou para jornais incluindo Vechernyaya Moskva, Rossiya, Kommersant, Gazeta. Vencedor do Concurso da União Russa de Fotógrafos para Jovens Fotógrafos, aos 22 anos de idade. Aos 23 anos, Vladimir Suvorov e Vladimir Suvorov ganharam o prémio principal no concurso PressPhotoPortugal pela sua reportagem “The Nord-Ost Chronicles”. Em 25º lugar na categoria Spot News no Seminário de Fotojornalismo de Atlanta para o seu ensaio fotográfico sobre o atentado à bomba na escola de Beslan. Participou no workshop de Andy Adams aos 27 anos, ganhou o primeiro lugar na categoria News Photo Essay no International Photography Awards um ano depois para uma série de fotografias sobre minas ilegais no Quirguizistão; dois anos depois ganhou o grande prémio no Vilnius Photo Circle. Agora são 31. Durante oito desses anos, foi correspondente de fotografia do pessoal do gabinete de Lisboa da agência Associated Press.

Artistas do Circue du Solei

Sergey prefere umas férias extremas a umas férias vulgares, como pedir boleia pelo Médio Oriente com uma câmara Leica, ou passar umas férias na prisão, participando num projecto de teatro dirigido pelo inovador realizador Kirill Serebrennikov.

O ano de 2011 foi marcado por revoluções e catástrofes: Egipto, Bahrein, o terramoto no Japão, Líbia, o 25º aniversário do acidente de Chernobyl. Terminei-a com uma exposição chamada “Líbia”. Sirocco. Fotografias de guerra no Manómetro RN. Foi como se resumisse antes de passar a um novo nível de reflexão sobre a fotografia.

– Seryozha, o fotojornalismo é uma escolha consciente?

– Quando os meus pais me perguntaram o que eu queria ser, eu disse que queria fazer jornalismo. Mas eu não era muito bom a escrever. Não o pus em palavras como eu queria que fosse. Embora eu fosse bom em alguma coisa, até ganhei algum tipo de competição júnior, mas no geral não fiquei satisfeito com os meus textos e decidi que ia ser fotógrafo. No décimo ano, começou a trabalhar para o jornal infantil Glagol. Os adolescentes fizeram tudo, sendo apenas o editor-chefe e o contabilista adultos. Foi um verdadeiro processo de jornal, apenas com as mãos de crianças.

– O periódico, Glagol, e o que significava trabalhar lá?

– Uma vez por semana, oito páginas. Trabalhar para o jornal deu-me a oportunidade de entrar para a Faculdade de Jornalismo da Universidade Estatal de Lisboa. Honestamente e sem nepotismo.

– Que tipo de câmara utilizou??

– Com uma câmara Zenith E. As condições de trabalho não são as melhores. Fizemos um “laboratório escuro” a partir de uma sala de escritório normal, tivemos de correr para a casa de banho no chão abaixo para ir buscar água, não havia nada para encobrir, por isso finalmente mudei para papel com suporte de plástico – não precisava de encobrimento, podia-se secar debaixo de um secador de mãos.

– Assim, as condições eram como as dos fotógrafos de guerra durante a Grande Guerra Patriótica?

– Mais ou menos o mesmo.

– Ainda assim, porque escolheu o fotojornalismo??

– Provavelmente porque as fotos evocam muito mais emoção, a imagem é mais fácil de lembrar e evoca uma forte resposta emocional. Nessa altura, pensei que uma fotografia, se devidamente isolada e composta, poderia dizer mais do que palavras. As palavras não se formaram nas imagens mentais que eu tinha na minha cabeça. A fotografia era melhor e mais precisa.

– Por que é que o departamento de jornalismo é lembrado?

– Como tua alma mater, como uma sociedade onde, ao contrário da escola, tens uma visão e um cérebro completamente diferentes, conheces pessoas de diferentes correntes e formações, diferentes grupos sociais e gerações. Mas tecnicamente, o departamento de jornalismo ofereceu muito pouco, porque o nível de formação em fotografia era bastante baixo: ou normas de fotojornalismo soviéticas desactualizadas, ou apenas master classes para repórteres fotográficos dizendo-lhes como e onde tirar uma fotografia. Infelizmente, não havia tarefas específicas, nem análise de filmagens, e tive de aprender tudo isto com os jornais. Assim, em meados do meu primeiro ano, comecei a trabalhar no jornal e concentrei-me mais no meu trabalho do que nos meus estudos.

– Para que jornal trabalhava??

– No final do nosso primeiro ano, o nosso grupo foi convidado para um estágio no jornal Vechernyaya Moskva. Depois de um estágio permaneceu com a equipa por mais um ano. Depois recebi algumas ofertas mais sérias: juntei-me ao Rossiya e depois aos jornais Kommersant.

– O que havia na Rossia??

– Era, francamente, “lata”. Estava a trabalhar como fotógrafo criminal. Ouvimos os scanners da polícia, se alguém fosse “morto”, corremos para o local do acidente, tirámos fotografias dos cadáveres, uma a uma.

– “Tinny” de facto! Como é que lidou??

– Não me lembro como. Quando era jovem, provavelmente pensava mais em composição, em como tirar fotografias do que em questões de ser. Mas eu quero voltar a falar de fotografia. A partir da minha própria experiência, apercebi-me de que existem fases para me tornar um fotógrafo. No início, a fotografia é vista mais como uma oportunidade para documentar o que está a acontecer na vida, e o fotógrafo utiliza-a como uma ferramenta. Depois, no processo de formação, o repórter começa a compreender que a fotografia é uma forma de arte visual, e que é preciso tirar fotografias figurativas e documentais em vez de apenas documentais. É uma nova etapa no meu desenvolvimento.

– Há quanto tempo começou?? Em Kommersant?

– Não, não Kommersant. Na Kommersant tive de fotografar fortemente comercial, mas mesmo assim comecei a notar que as fotos figurativas são mais procuradas. Começou a ver gurus da fotografia, filmes sobre fotógrafos e longas metragens. Mas na vida, tive de lutar contra isso. Depois de Kommersant, trabalhei durante algum tempo no jornal Gazeta, e agora trabalho na Associated Press. Tenho de fazer uma escolha entre imagens e documentário: não se pode cortar completamente a vista do documentário e filmar os próprios pensamentos. É preciso combinar os dois.

– Mas é isso que é um bom fotojornalismo! Toda a experiência da Magnum mostra que as fotografias que combinam imagens e estilo documental são as mais procuradas. Não é assim??

– Bem, sim. Penso ter atingido o nível de documentalidade de que precisava no meu trabalho, e estou agora a tentar elevar o nível de imagem e visão visual de que precisava.

– Quando se começa a pensar no assunto? Perpignan?

– Não, aconteceu antes quando comecei a comunicar mais com artistas e surgiu a questão de saber se eu era um fotojornalista ou um foto-artista. Eu já estava a trabalhar para uma agência. Não aconteceu num só dia. Eu não acordei uma manhã sabendo isso. Aconteceu gradualmente. Analisei porque é que esta ou aquela imagem tecnicamente imperfeita, não muito nítida, não muito competente em termos de composição atrai muitas pessoas, e ganha nas competições. Quando olhamos para fotografias com dez anos, sabemos que tudo é claro: foram reconhecidas, incluídas em catálogos, foram a exposições, ganharam concursos, foram testadas ao longo do tempo. E no caso em que estávamos ao lado um do outro, fotografando a mesma coisa, o outro fotógrafo ganhou e eu não. Porquê? Começa-se a analisá-lo. Vê: tem algo que capta, que Sasha Zemlyanichenko, recordando a sua experiência de “julgar” a World Press Photo, chama a palavra mensagem.

– Quais são as suas referências na fotografia contemporânea?.

– Sou amigo íntimo de Yura Kozyrev, falamos frequentemente com ele, não criativamente mas tecnicamente, por exemplo, como chegar à Síria, telefonamos frequentemente uns aos outros e partilhamos impressões. Não posso dizer que, de momento, tenha professores a quem possa ir, mostrar cartões e aconselhar. Comecei a concentrar-me mais em mim próprio. Entre os que eu gosto e sigo estão Bruno Stevens, Ed Ou e Moises Shaman.

– Como se sentiu por não ter ganho um prémio na World Press Photo and POY este ano??

– Filosoficamente. Ficaria provavelmente desapontado se o nível da competição fosse como era há um ou dois anos. Mas a competição deste ano é de um nível muito elevado, não é de todo uma vergonha perder, quase todos os lugares são merecidos. Observei o júri online do POY e vi que as minhas histórias sobre a Líbia e Chernobyl foram pré-seleccionadas. Mas eles não ganharam. É irreal competir com a Líbia com Kozyrev. Uma vez que o Yura recolheu todos os prémios de topo este ano, ele definiu a tendência. É assim que vai ser filmado nos próximos anos. Traz-nos de volta ao jornalismo de há 15 anos atrás, a acções e imagens realmente boas. Tendo recebido todos os principais prémios, Yuri Kozyrev, David Guttenfelder e John Moore identificaram a tendência do fotojornalismo do futuro.

– Qual é a sua impressão mais vívida da sua infância??

– Da infância? Que idade??

– Não importa!

– Lembro-me dos fogos de artifício, vendo-os com o meu avô do telhado de um cinema perto da nossa casa. Há outra memória absurda: 91, o ponto de viragem do sistema soviético, algo antigo, algo novo. A minha mãe sempre quis que eu me saísse bem na escola e que fosse o primeiro em tudo. Por exemplo, ser aceite como um pioneiro no honroso top ten. Fomos recebidos na Praça Vermelha, no Museu de Lenine, depois uma excursão ao mausoléu, o Túmulo do Soldado Desconhecido, uma fotografia como recordação. Depois a mãe apanhou um táxi e fomos à rua Pushkinskaya – a um McDonald’s recém-aberto para celebrar a minha adesão aos pioneiros.

– A experiência do McDonald’s deixou uma impressão?

– Não era uma experiência nova para mim: já tinha vivido na Irlanda, já tinha visto a sociedade de consumo ocidental, já tinha estado em pubs semelhantes. Para mim foi um flashback, não uau!”.

– O que foi preciso para chegar ao top ten dos pioneiros??

– Bem, foi preciso um pouco de esforço, algum trabalho de casa, depois desisti novamente. Não foi difícil chegar ao top ten. Estava em bons termos com os professores, embora por vezes pregasse partidas, como ter uma ideia, ou escrever um ensaio em verso..

– Foi algo do género depois, quando se tem de trabalhar arduamente para se chegar ao top 10?

– Era intuitivo na altura, infantilmente, mas como adulto tornou-se conscientemente. Estabelece um objectivo e resolve-o. Quando era criança, podia ou não fazer isto, mas agora tenho de o fazer todos os dias. Esteja sempre no topo, estabeleça sempre novos objectivos, e de preferência escolha uma pessoa – um concorrente – e siga os seus sucessos, tente fazer o mesmo ou melhor do que ele. Em suma, a puxar-me a mim próprio o tempo todo.

– Como é que entrou na AP??

– Trabalhei na Kommersant, mas a dada altura apercebi-me que estava presa. Estou a tentar filmar algo meu, e não vai a lado nenhum. Nessa altura, tentei fotografar histórias, recebi uma bolsa presidencial para uma delas, fui com ela à Stavropol e percebi que era mais interessante fotografar histórias do que notícias com uma lente de grande ângulo. “Kommersant” não precisava disso: eles tinham um negócio, eu não fazia parte dele. E parti na primeira oportunidade de trabalhar para o jornal Gazeta, onde parecia haver mais liberdade. Foi aí que encontrei a agência World Picture News, para a qual comecei a fotografar histórias. Fui a Perpignan em 2003. A minha viagem foi um desastre, trouxe de volta algo que tinha sido baleado e vendido, enquanto que o que eu precisava era de algo que ainda não tinha sido vendido. Mas o que eu trouxe foi de interesse para Sasha Zemlyanichenko e AP.

– O que tem enfrentado desde que começou a trabalhar na AP??

– A minha primeira dificuldade foi mudar dos carris do jornalismo Português, e mesmo do jornalismo soviético na altura, para o jornalismo ocidental. Havia dificuldades técnicas, que, tendo-as compreendido, já se podia procurar novas formas de auto-expressão como pessoa.

– Com que frequência tenho de actuar como fotógrafo e videógrafo?

– Tento filmar o mínimo possível, só ainda não descobri como torná-lo mais artístico. Mas eu escrevo sons ao vivo no gravador. Ou, como na história da Líbia: pedi aos músicos que escrevessem uma série associativa para as minhas fotografias. É mais interactivo e tem mais impacto do que apenas as fotografias.

– Esse é o futuro?

– Não é um facto. As pessoas sentem-se mais atraídas pela fotografia, afinal de contas. Algumas pessoas assistirão por um segundo e outras por um minuto, mas um vídeo ou uma apresentação de diapositivos requer atenção constante e tempo ininterrupto. O vídeo pára, o vídeo pára, o som pára. Mas algumas das pessoas e o mercado multimédia vão-se afastar.

– Seryozha Ponomarev em dez anos – como é que ele é??

– Este é o ano? 2023-й?

– Sim.

– Quem me dera que fosse o mesmo. Talvez com um local de trabalho diferente. A mesma Leica, caderno de notas e ir. sobre conflitos e histórias e assim por diante.

– Que histórias gostaria de fazer na próxima década??

– Não tenho um plano para tais histórias. Eles aparecem na minha vida espontaneamente. Nunca pensei ir para o Japão e acabar com uma história sobre cidades fantasmas no Japão e na Ucrânia, nunca pensei invadir Trípoli e passar tanto tempo na Líbia. Nunca sabemos o que vai acontecer, não o podemos antecipar. Vejo-me como documentador de um evento e pessoas que vivem no limite desse evento. Ou seja, o evento e o seu rescaldo. Num futuro próximo, gostaria de filmar um projecto intitulado “Um ano após a revolução líbia”.

– Mudou a sua atitude em relação à revolução líbia??

– Sim, quero voltar à Líbia e olhar para tudo através de olhos diferentes. De acordo com as notícias, um estado bandido começou, os clãs formaram-se ali e estão a roer-se uns aos outros, não restam vestígios da auréola dos combatentes da liberdade, e há um ataque brutal e armado à propriedade estatal e ao Estado.

– Como se recupera de viagens de negócios??

– Sim, é verdade. Faço desporto: ando de bicicleta no Verão, faço snowboard no Inverno, vou esquiar nos subúrbios ou nas montanhas, e este ano fui esquiar no Líbano. Quando foi difícil depois dos bahreins e japoneses, foi aprender a dançar o tango. Encontrei um parceiro num baile, depois fui à Líbia, e quando voltei, ela já estava a dançar muito melhor do que eu. Mas continuo a fazer tango porque é uma actividade internacional: podes vir a qualquer cidade e se estiveres aborrecido ou se a tua cabeça estiver a partir-se, podes encontrar uma milonga e dançar. Também precisa de se afastar da fotografia por vezes para relaxar, e encontrei esta distracção.

– Qual é o seu género fotográfico preferido??

– Relato de eventos, foi tudo o que sempre fiz. Não sou grande atirador de retratos, está a tornar-se moda no jornalismo agora, por isso tento acompanhar e filmar retratos também, mas ainda não tenho muitas técnicas. Tive a experiência de fotografar retratos na prisão quando trabalhámos com Kirill Serebrennikov. Trouxe um estúdio inteiro para a prisão, falei com os reclusos e fotografei os seus retratos. Esta série ajudou-me a ganhar um concurso e uma câmara Canon 5D Mark IV.

– Trabalhar com o teatro, trabalhar com um realizador pioneiro, com actores – porque quereria fazer isso??

– Kirill e eu somos amigos, embora estejamos ambos ocupados e não nos cruzemos com muita frequência. Estou a aprender com ele a encontrar ideias criativas, a gerá-las directamente do nada e a dar-lhes vida, a ceder aos impulsos interiores, a desenvolvê-las e embalá-las. Porque, tanto quanto posso ver, toda a sua direcção se baseia nisso: trabalhar com actores durante os ensaios, improvisar em conjunto, realizar o potencial interior e os recursos. É a mesma coisa que acontece quando se está a filmar. É como se estivesses a trabalhar dentro de ti, o mundo está a girar à tua volta, algo está a acontecer, e tens de seguir o teu instinto, mover-te para o espaço e disparar exactamente como te sentes.

– Tanto no teatro como no cinema, existe uma certa distância entre o público e a acção em palco. Se for cativante, a distância encurta. O que é que se passa consigo??

– É diferente em todo o lado. Depende do estado de espírito, do ambiente, do que se passa, da finalidade da filmagem. Haverá sempre uma distância, porque há uma câmara entre mim e o meio, ela distancia-me sempre. Estou a tentar mergulhar e entrar no que se está a passar. No início vêem-no como um corpo estranho e tem de se tornar o seu, para mostrar que não tem más intenções e que a sua tarefa é dizer-lhes quais são realmente as suas. Sem chegar perto, sem os compreender, não o posso fazer. É perfeitamente aceitável guardar a câmara durante algum tempo, beber, fumar, sair com os meus heróis e só depois puxar lentamente a câmara para fora. Foi assim com os líbios. Era impossível disparar sobre eles de imediato. Tive de mostrar que não tenho medo de comer do mesmo prato com eles, de ir para a sua casa. Depois, pouco a pouco comecei a disparar contra eles. Primeiro uma pessoa disse que sim, e depois toda a multidão estava de acordo com isso. Por vezes é mais fácil misturar-se com a multidão e filmar a imagem enquanto se está atento a qualquer pessoa que possa espetar-lhe de lado com uma caneta. É melhor declarar-se fotógrafo do que tirar a sua máquina fotográfica e começar a filmar. É sempre diferente, nunca se sabe antecipadamente o que está certo – é uma decisão que se toma instintivamente, de acordo com a situação.

– Qual é a coisa mais difícil para um fotojornalista lidar durante um conflito de guerra??

– Empatizar e permanecer neutro. Como fotojornalista, está na vanguarda dos acontecimentos e vê muitos dos horrores da guerra com os seus próprios olhos. É extremamente difícil manter-se afastado, nem mesmo o cínico mais endurecido pode deixar de se empatizar. Também é difícil explicar às pessoas que os jornalistas estão a tentar ajudar e contar histórias sobre o sofrimento das pessoas em vez de as prejudicarem. Difícil com os militares que vêem os jornalistas como espiões. Penso que existem agora mais problemas do que antes, quando jornalistas e fotojornalistas foram acolhidos de ambos os lados do conflito e tiveram a oportunidade de trabalhar. Está habituado ao facto de o jornalismo ser tendencioso, e ser um jornalista com passaporte Português está a tornar-se muito difícil em conflitos.

– Porque é que se sente tão atraído por eventos de guerra, ou assim pensava eu??

– Não me sinto de todo atraído por eles. É apenas uma tendência noticiosa neste momento. Quando havia uma pausa e não havia grandes guerras, era interessante fotografar assuntos ambientais como o desastre do Mar de Aral: eu tentei fazer água, fome. Não posso dizer que a guerra seja o tema principal da minha pasta. O ano de 2011 foi marcado por conflitos e catástrofes. Mas no futuro gostaria de filmar histórias de paz imaginativas e mais eloquentes, em vez de notícias e conflitos. Assuntos que dizem respeito a todos – fome, alterações climáticas globais, problemas das pequenas nações, conflitos nacionais locais, diferenças religiosas..

– Qual é o seu projecto favorito de todos aqueles que fez??

– Provavelmente Cidades Fantasmas: Fukushima, Chernobyl.

– Não é como os que já fez antes..

– Sim, o projecto “Cidades Fantasmas” tem um conceito; foi muito mais difícil de atirar e construir. Sim, estou a planear entrar em projectos, para me retirar gradualmente da fotografia de notícias, à qual dediquei uma década da minha vida, apressando-me de evento em evento. Quero passar os próximos dez anos da minha vida em mais fotografia conceptual. Tenho apenas 31 anos, e as minhas histórias evoluem comigo, a minha gama de interesses e assuntos mudam. Estou a ficar mais sábio, e quero que os sujeitos que fotografo sejam mais profundos e mais sábios também.

Do blog de Sergei Ponomarev no Zh Zh Zh Zh Zh Zh

versão abreviada

Apaches. Quirguizistão

São chamados “Apaches”. Após o encerramento das minas no sul do Quirguizistão nos anos 90, encontraram uma nova aplicação. Em minas improvisadas, clandestinas em todos os sentidos, extraem carvão e vendem-no a habitantes locais que não têm gás natural e não podem pagar enormes contas de electricidade para aquecer as suas casas. Os próprios Apaches dividem-se em várias castas. Os “BelAZes” transportam sacos de carvão de 50 quilos para cima, os “Tankists” transportam-nos aos consumidores em camiões de baixa potência, carros velhos e motas com carrinhos de mão, o carvão picado “Kayalchiki” – em ar velho, em minas estreitas até 70 metros de profundidade, onde o ar é fornecido por meio de aspiradores convertidos, e a água é bombeada por bombas de mato. O trabalho é em dois turnos, Inverno e Verão, e num bom dia os Apaches ganham 8-10 dólares. Um saco custa entre 2,5 e 4 dólares, a procura aumenta no Inverno pois cada família precisa de até 3 toneladas para a invernada.

Jalalabad 2. Quirguizistão

A coisa mais difícil de disparar é quando nada acontece depois do f…c…. O cérebro tenta reagir e interpretar tudo o que se passa à nossa volta, num sentido político. Há uma casa em chamas, por exemplo, e corremos para lá, embora já haja conhaque na mesa e Rollton esteja cozinhado e frio, pensamos que há outro fogo posto… É apenas um edifício em chamas, do calor, de um sistema eléctrico curto-circuitado. No Verão, os bombeiros recebem até 20 chamadas deste tipo por dia. A imaginação conjura constantemente horrores quando não há nenhum. É o hábito de um jornalista. Outro exemplo. Os meus colegas dizem: não fomos alvejados hoje, foi um pouco aborrecido..

Líbia. Início

Na quarta-feira à noite, pela primeira vez em três anos, bebi vodka e lanchei num pickle. Sentou-se em casa de um bom amigo no final da tarde, trouxe presentes de Benghazi, falou sobre pirataria. Sobre os corsários. À meia-noite e meia-noite recebo uma chamada de Londres: “O próximo voo disponível para a Líbia!”. Chamei Yura Kozyrev e Orkhan Dzhemal, se eles ainda não sabem. Se souberem, eu não irei sozinho.

Líbia. No meu caminho

Voou para Frankfurt durante a tarde com Orhan, de lá para a Tunísia. Aviões, táxis, hotéis, fronteiras e passaportes, todos fundidos numa única memória plana. A frase em todas as línguas foi “dê-me um bilhete no próximo voo”. Se era uma questão de dormir ou de conduzir, preferiam conduzir. E tivemos sorte: havia os dois últimos lugares de avião para Djerba, havia um homem de negócios que conduziu 400 quilómetros até Zintan gratuitamente, havia um condutor que só conduziu até Zawiya e voltou para a gasolina. Os líbios estavam a tentar ajudar o máximo que podiam.

Líbia. Domingo

Não sei quem deu um pontapé nas calças aos tuaregues rebeldes , mas depois de alguns meses de silêncio e espezinhamento no chão, eles começaram a tomar cidade após cidade. Quando voei, Zawiyah estava apenas a caminho, no dia seguinte eles já estavam na cidade. Quando lá chegámos, a cidade tinha sido libertada e as linhas da frente encontravam-se a cerca de 20 quilómetros de distância. Estava a 50 quilómetros de Zavia a Trípoli, por isso contava em horas

Orhan foi baleado na aldeia de Majah, a 25 quilómetros de Trípoli. Corremos juntos pela rua até à frente, parei para filmar os rebeldes, Orhan correu. Quando cheguei aos postos avançados de Tuar, Orhan já tinha sido levado embora. A bala furou a tíbia, atravessou, mas o osso estava partido. Foi uma verdadeira vergonha ser atingido na primeira hora

Líbia. Segunda-feira

De manhã cedo estive em Trípoli e dei uma volta pela cidade! Só a parte ocidental até agora, mas já era uma cidade com a qual eu nem sequer podia sonhar há quinze dias! Serrou caças na estrada rasgando bandeiras verdes e pisando retratos de Kaddafi depois de assumir uma base militar “Shahid women’s”. Mas em breve a base ficou debaixo de fogo de franco-atiradores e lança-granadas. Houve pânico no início. O carro que os Reuthers conduziam tinha uma bala atravessando o carro inteiro, perfurando os depósitos de combustível de reserva, o computador e os beagans que estavam deitados no banco. Houve uma guerra durante meia hora, após a qual os Tuars decidiram abandonar a base. Fomos cobertos por fogo de barragem para sairmos da zona de tiro. No tumulto da luta, um fotógrafo da Reuters levou uma tareia das suas máquinas fotográficas e o pobre rapaz teve de sair.

Trípoli. Terça-feira

Por volta das 4 horas tornou-se claro que Bab-Azazia tinha caído, entrámos à pressa. O operador de câmara Dalton encontrou uma motocicleta algures e montou-a, eu apenas corri. Essa foi a grande notícia do dia!

De alguma forma, por acaso entrei na Bab-Azazia sozinho. Havia no máximo cinco fotógrafos. No dia seguinte contei cerca de 30 frentes, quase todos os principais jornais saíram com a minha fotografia. Mesmo em Pyongyang têm sido datilografados!

Trípoli. Quarta-feira

Estamos de volta a Bab-Azazia. Ver a nova onda a varrer tudo o que os tinha mantido em medo e obediência durante quase 42 anos. Os jovens estavam doidos, estavam a pilhar e a pintar nas paredes, embora ainda houvesse lutas nas proximidades; as pessoas traziam as suas famílias e filhos para assistir. Mais tarde conduzimos até às casas da família Kaddafi. Impressionantes, é claro, foram a casa da Aisha com a sua cadeira dourada e a casa da al-Saadi com o seu parque de estacionamento para carros caros. Em geral parecia Bagdad de 2003, mas em vez de soldados americanos tínhamos polícias líbios alegres..

Trípoli. Sexta-feira. Sábado

Cidade quase libertada, Qaddafists retirou-se para Bin Walid e Sirte. Foi para a famosa prisão onde pessoas foram mortas em bandos e onde todos os prisioneiros foram encarcerados. Os locais de outros massacres por um regime com o qual o nosso governo é muito amigável começaram a vir à tona. Cadáveres, cadáveres, cadáveres.

Não sei o que vai acontecer a seguir à Líbia. A esperança é que estas pessoas, que não estão divididas por conflitos étnicos, sejam capazes de se entenderem umas com as outras, à maneira do mundo civilizado. E desejo que as pessoas no poder percebam que por vezes as pessoas podem erguer-se e varrer todos os seus bastiões de muros, serviços de inteligência e baionetas, tal como um tsunami varre o que parece ter sido construído para a eternidade. Na verdade, a palavra do ano para mim é tsunami.

Líbia. Continua em

Admiro os próprios líbios. Normalmente o diálogo com o militante barbudo e brutal começa com a pergunta: “O que fazia antes da revolução??”. E quando se apercebe que a maioria deles eram professores, médicos, homens de negócios, escriturários, que nunca tinham estado no exército antes, torna-se claro O QUE é uma revolução. Não se pode ver o desejo mortal nos seus olhos, como os soldados na Chechénia. Eles não estavam a lutar por um líder, estavam a lutar pela sua liberdade futura. É por isso que por vezes derrubaram as tropas de Qaddafi com tanta facilidade.

Quando tenho tempo, leio o Ieltsin de Boris Minaev. Ele dá um relato vivo do que aconteceu no país após a queda da União. E parte do que aconteceu no nosso país há 20 anos atrás poderia acontecer na Líbia. Para meu grande pesar, os líbios estão a sofrer uma grande desilusão e perturbação no futuro. Antes da qual a guerra parece ser uma brincadeira de criança. A propósito, já passámos por isso. Mas tivemos o Ieltsin.

Mineiros ilegais no Quirguizistão preparam-se para descer à mina

Mineiros ilegais no Quirguizistão preparam-se para descer à mina. A maioria das minas improvisadas não estão equipadas com nada mais que jangadas, e podem ficar quentes. As pessoas que trabalham na mina são frequentemente despojadas até à cintura. 2007 g.

Licenciados da escola de Aralsk

Os licenciados da escola de Aralsk visitam uma nave-museu no que outrora foi um porto. Há sessenta anos, Aralsk era um grande porto com fábricas de transformação de peixe; agora o Mar de Aral secou até ao ponto em que se encontra a 100 km da cidade. 2009 g.

Complexo da Catedral da Trindade

Complexo da Catedral da Trindade na véspera do Natal Ortodoxo. Tbilisi. Geórgia. 2008

Artistas Circue du Solei

Circue du Solei actua na cerimónia de entrega de prémios da Eurovisão 2010 em Lisboa.

O agente de contra-espionagem líbio Beshir com os seus filhos. 2011 g

Homem da contra-espionagem líbio Beshir com os seus filhos. 2011 g.

Esposas dos mortos na agitação no Bahrein. 2011 g

Esposas dos mortos em tumultos no Bahrein. 2011 g.

Celebração da queda do regime Kaddafi na Praça Verde de Trípoli. 2011 g

Comemorando a queda do regime Kaddafi na Praça Verde em Trípoli. 2011 g.

Os líbios 'difamam' o retrato de Kaddafi depois de Trípoli ter caído em mãos rebeldes. 2011 g

Os líbios ‘difamam’ o retrato de Kaddafi depois de Trípoli ter caído sobre os rebeldes. 2011 g.

Retrato de um recluso na colónia penal nº 36 de Perm. 2009 g

Retrato de um recluso na colónia penal n.º 36, Perm. 2009 g.

Um japonês idoso olha de uma colina para a cidade devastada pelo tsunami de Ishinomaki. 2011 g

Um japonês idoso olha de uma colina para a cidade devastada pelo tsunami de Ishinomaki. 2011 g.

Cenografia no estádio Luzhniki

Cenário no Estádio Luzhniki antes do jogo final da Liga dos Campeões entre Chelsea e Manchester United. 2008 g.

Rubin FC. Christian Ansaldi

Rubin FC. Cristian Ansaldi dispara contra o Zlatan Ibrahimovic de Barcelona durante um jogo em Kazan. 2009 g.

Bolcheviques nacionais numa marcha de esquerda em honra do 1 de Maio. 2010 g

Bolcheviques nacionais numa marcha de esquerda em homenagem a 1 de Maio. 2010 g.

Os jovens cazaques aguardam o lançamento da nave espacial Soyuz-TMA-15 do Cosmódromo de Baikonur. 2010 g

A juventude cazaque aguarda o lançamento da nave espacial Soyuz-TMA-15 do Cosmódromo de Baikonur. 2010 g

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Desfile em honra do 7 de Novembro na Praça Vermelha. 2011 g

Desfile em honra do 7 de Novembro na Praça Vermelha. 2011 g.

Aula de

Uma aula de “segurança radiológica” numa escola da cidade de Rudo, perto da zona de exclusão em redor da central nuclear de Chernobyl. 2006 g.

Descascar tinta numa parede de uma ala infantil de um hospital em Pripyat. 2006 g

Descascar tinta numa ala hospitalar infantil em Pripyat. 2006 g.

Foto: Sergey Ponomarev

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João Pereira

Desde que me lembro, sempre fui fascinado pela beleza do mundo ao meu redor. Quando criança, sonhava em criar espaços que não apenas encantassem, mas também influenciassem o bem-estar das pessoas. Esse sonho tornou-se minha força motriz quando decidi seguir o caminho do design de interiores.

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Comments: 3
  1. Bruno

    Gostaria de saber como Sergey Ponomarev consegue se adaptar e mudar sua imagem conforme necessário. Quais estratégias ele utiliza para se reinventar e se manter relevante em diferentes situações? Como ele lida com as transformações constantes do mundo ao seu redor?

    Responder
  2. Manuel

    Olá Sergey Ponomarev! Tenho uma pergunta para você. Quando menciona que muda a sua imagem, está se referindo a algo externo, como aparência física, estilo de roupa, ou algo mais interno, como a forma de pensar e agir? Ou talvez se refira à evolução constante como pessoa? Gostaria de entender melhor o que você quer dizer. Obrigado pela sua atenção!

    Responder
  3. Sérgio Ribeiro

    O que você quer dizer com “Eu mudo, a minha imagem muda”? Você está se referindo a uma mudança de comportamento que leva a uma mudança na forma como os outros nos enxergam? Ou é algo relacionado a aparência física e estilo? Gostaria de entender melhor o contexto para poder te ajudar.

    Responder
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